Capítulos (1 de 1) 03 Sep, 2023

Sol de Prata - Prólogo

18 de julho de 1923 - Era da Luz.

O manto negro da noite se estendia por todo o céu de Azgra e belos diamantes celestiais começavam a adorná-lo, acompanhado da brisa gélida vinda de Gonwë, a ilha de gelo, palco de uma antiga batalha que marcou a história do reino de Azgra para sempre.

Em meio a escuridão, ainda havia uma parte intocada pelas estrelas que surgem. Lá, uma forte luz podia ser vista além da Estrada Real. Não uma luz amigável, cujo esplendor inspira quem a vê, acendendo uma centelha de esperança no coração, convidando a aproximar-se para sentir seu calor na alma e usufruir de sua segurança; mas sim, de um terror avassalador capaz de causar arrepios e penetrar cada fibra do corpo, paralisando os fracos de espírito até que suas chamas venham devorá-los.

Aqueles que tiveram coragem de seguir os rastros de calor e fumaça descobriram sua origem na praça do centro da cidade de Méazös, onde chamas de coloração anil consumiam tudo o que tocavam até que não restasse nada mais que cinzas.

Entre as chamas podia-se avistar dois personagens, envoltos em uma espécie de círculo do mesmo fogo destruidor. O primeiro possuía uma estatura mediana, olhos azuis como o céu ao meio-dia, pele clara, barba grande o suficiente para esconder-lhe parte do pescoço, com cabelos negros na altura da nuca. Seu físico era forte e imponente, não fora as roupas de camponês que vestia, podia-se afirmar que tal homem era de nobre estirpe, pois empunhava, com ambas as mãos, uma espada longa cuja lâmina era de uma mescla de mithril e cobre e seu esmero refletia a extraordinária habilidade de quem a forjou. O segundo era alto e esbelto, seus olhos eram como âmbar sob o sol e seu olhar subjugava quem se atrevesse a confrontá-lo. Sua pele era negra como a noite; de cabelos longos e brancos com mechas trançadas nas laterais e de orelhas pontiagudas, trajava uma armadura de batalha, feita de uma espécie de minério negro semelhante a obsidiana, adornada com ouro e rubis. Em cada uma das mãos havia uma espada de lâmina azul como a lua de Thiërallia.

Ali, envoltos pelo fogo que tudo consumia, Homem e Elfo adotaram uma postura defensiva enquanto analisavam cuidadosamente seu adversário.

— Tem certeza de que deseja me enfrentar? – Disse o elfo sorrindo.

— Ora, que escolha eu tenho? A morte nos cercou. Só me resta saber qual de nós ela levará consigo. – O homem devolve o sorriso.

— Tsc, vocês mortais não passam de vermes. – Disse apontando uma das lâminas para seu adversário. — Irei sepultá-lo aqui para que Wendariel gere vida útil neste solo com teus ossos.

— Que assim seja! – Sem sequer tomar fôlego, o homem gera uma carga elétrica que flui de suas mãos e envolve a lâmina da espada. Em seguida, ele rapidamente avança em uma corrente elétrica em direção ao elfo. Porém, devido ao calor do ambiente, parte de seu poder foi neutralizado e o fez perder velocidade permitindo que o inimigo interceptasse sua investida utilizando uma de suas espadas. — Fogo de merda! Não fosse por isso, o teria atingido em cheio. – Pensou ele.

— Interessante...! – Disse o elfo, fitando os olhos daquele que o desafiou. — Você tem muita coragem. Em teus olhos vejo uma chama que arde em poucos, mas que jamais deram um único passo para me queimar com ela. – Após pronunciar essas palavras, o elfo faz um gesto com a outra mão e as chamas ao redor, gradualmente, se dissipavam.

— O que ele está tramando? – Pensou enquanto observava surpreso o dissipar das chamas.

— Vamos, mortal, surpreenda-me! – O elfo empurrou o humano, que caiu a uma distância de aproximadamente 5 metros. — Mostre-me qual benção a maldita Auriën derramou sobre ti! LUTE COMIGO, WEAVERN!

— Ränaghar... – Weavern rapidamente pôs-se de pé e, assumindo uma postura ofensiva, canalizou sua energia, que agora fluía por todo o seu corpo, na espada. — Juro por Auriën que não permitirei que continue machucando nosso povo. Se morrerei por tuas mãos, que ao menos seja tentando arrancá-las! – Embora nenhuma expressão de medo tenha sido esboçada pelo homem, podia-se sentir a apreensão em sua voz.

A voz do mortal recém chegou aos ouvidos do elfo e a lâmina de cobre já estava posta em sua garganta. O movimento foi tão rápido quanto um relâmpago. Era a primeira vez desde que se convertera ao deus da Escuridão, Maherlyondhür, que Ränaghar sentia o sabor da derrota e o toque da morte em seu âmago.

O ataque era mortal, mas, graças ao poder que seu senhor o concedeu, Ränaghar esquivou-se convertendo seu corpo em névoa realizando uma espécie de teletransporte e reaparecendo a poucos passos dali. Assustado, o elfo mal conseguia processar o que acabou de acontecer.

— Auriën, sua desgraçada... – Disse olhando suas mãos trêmulas. — Continua favorecendo uma casta imunda como essa?! MALDIÇÃO! – Esbravejou enquanto alimentava o rancor em seu coração ao recordar a “traição” da Deusa da Luz, sofrida há centenas de anos e que resultou no extermínio de seu clã. — Encontrarei cada maldito humano que se curvar em teus altares, mancharei de teus vestidos com o sangue deles até que a venhas para enfrentar-me! Juro pelos ossos de meus ancestrais que farei de tudo para vingá-los!

Cegado por sua fúria, Ränaghar não percebeu a nova investida do humano que, dessa vez, o atingiu em cheio no peito, arrastando-o pelo ar até colidirem com uma das casas ao redor. Com o impacto, uma nuvem de poeira e cinzas cobriu o local. Houve silêncio por alguns segundos. Então, ouviu-se o tilintar das lâminas ressoando em meio a poeira até que, subitamente, o guerreiro foi lançado para fora da cortina que os ocultava sendo levado ao chão por um raio de coloração semelhante as chamas que queimavam a cidade. Em seguida, Ränaghar surgiu caminhando lentamente em direção ao homem caído, nitidamente ofegante e com uma mão ao peito. Ora, o intuito do golpe desferido pelo guerreiro era perfurar o coração do elfo, mas sua armadura era resistente e absorveu a maior parte do impacto; ainda assim, a investida causou um dano considerável ao peitoral, mesmo não sendo o suficiente para penetrá-lo até perfurar a carne.

Sangue escorria pelo campo de batalha. Com seu último golpe, o elfo conseguiu cravar uma de suas espadas no ombro direito de seu inimigo antes de arremessá-lo para longe era seu sangue que banhava o cenário. A dor do ferimento consumia Weavern de tal maneira que seu pensamento oscilava entre a batalha e a preocupação com sua esposa e filho. Quando finalmente recobrou o foco, percebeu que o temível Ränaghar estava a poucos passos de distância, pronto para colocar um ponto final na luta que travavam.

— Preciso dar um jeito de detê-lo aqui e agora. Não posso permitir que continue com essa loucura. – Pensou enquanto tentava levantar, mas, ao fazê-lo, faltaram-lhe forças e ele caiu. Por causa da grande perda de sangue, seu corpo estava debilitado. Aos poucos, sua vida se esvaia. Grandes gotas de sangue escorriam pela lâmina azulada em seu ombro. — M-maldição...! – Lamentou tentando alcançar sua espada à alguns centímetros de sua mão esquerda.

— Acalme-se, não faça tanto esforço. Já não precisa mais lutar... – Ränaghar pisou na mão de seu adversário impedindo-o de alcançar sua arma. Em seguida desferiu um chute em sua boca, quase nocauteando o homem. — Resistir é inútil. – Ele arranca a espada que está no ombro de Weavern, que recobrou seus sentidos e urrou de dor antes de desmaiar, em choque.

Enquanto isso, próximo à entrada de Méazös, um jovem corria pelas ruas em busca do local do incidente. Ele se deteve ao ouvir um grito de dor.

— Pai...?! – Identificando de qual direção viera o som, ele sai em disparada ao seu encontro. — Merda! – Lágrimas escorriam pelo seu rosto e um arrepio percorria seu corpo só de imaginar que aqueles gritos poderiam ser de seu pai.

Chegando ao local de onde vieram os gritos, o jovem congelou.

— P-pai... Não...!

A cena era estarrecedora. Diante dos seus olhos estava o corpo de seu pai banhado em sangue enquanto sua cabeça, suspensa pelos cabelos, era ostentada por Ränaghar.

Subitamente, uma brisa quente encheu a praça e, novamente, o centro da cidade ardia em chamas. Dessa vez não era obra do elfo. As labaredas eram mais altas e ardiam com tanta violência que a água do chafariz que estava próximo ao elfo evaporou quase que instantaneamente.

— O-o que significa isso?! – Ränaghar estava surpreso com o poder que o cercava. Lançando seu olhar ao redor, apreensivo, viu o jovem parado entre as chamas. Seus olhos eram azuis como os do pai, a pele clara, cabelos longos e vermelhos tal qual as chamas que ardiam no local. — Você...! – O elfo interrompe sua fala ao notar que o olhar daquele que estava diante de si possuía um olhar tão intenso e poderoso quanto aquele que derrotou há poucos minutos. — Os deuses estão de complô contra mim? Até o senhor do sol, Maedhür, aponta seu dedo para mim, para me julgar! Malditos sejam todos os que se opuserem a mim! – Ränaghar range os dentes, furioso.

— Servo das trevas... – O jovem deu um passo à frente e as chamas ao redor se agitaram. — Assim como a luz sol devora a escuridão da noite, juro por meu pai que o matarei e as chamas da minha vingança consumirão teu corpo até que tuas cinzas se espalhem e despareçam desse mundo para sempre! – Outro passo e o fogo se agitou novamente, era como se dançasse em comemoração à batalha que estava prestes a começar.

— Hahahaha...! Então esse verme é teu pai? – O elfo olha para o rosto de Weavern que está em suas mãos. — Vejamos se ele te ensinou algo além da estupidez. – Ränaghar jogou a cabeça sobre o cadáver pálido e pegou a espada de seu adversário que estava próxima ao corpo. Em seguida, a jogou aos pés do rapaz e retirou sua espada que antes estava fincada no chão próxima ao cadáver do inimigo. — Vamos, jovem... – Disse enquanto desembainhava a outra espada. — Teu pai o aguarda.

O primeiro movimento foi de Ränaghar. Ele correu velozmente em direção ao jovem, mas uma coluna de fogo surgiu em seu caminho e ele se deteve. No instante em que o elfo estendeu uma das mãos para eliminar o obstáculo a frente, uma pequena bola de fogo o atingiu pelas costas. O ataque não o causou dano algum, mas foi o suficiente para distraí-lo fazendo com que desse as costas para coluna de fogo. Foi nesse momento que uma lâmina alaranjada traspassou as labaredas e atingiu Ränaghar nas costas, no mesmo ponto onde recebera o impacto da bola de fogo. A espada brilhava como o magma e seu calor derreteu a armadura do elfo permitindo que a ponta da lâmina a perfurasse e, superficialmente, ferisse a pele do elfo. Ränaghar sentiu a dor do golpe, mas nenhuma palavra saiu de sua boca. Ele escapou da morte convertendo-se, novamente, em névoa. O Jovem rapidamente a atravessou e, logo que seus pés tocaram o chão, virou-se fazendo um movimento com uma das mãos como se estivera arremessando algo em direção a névoa. Imediatamente todo o fogo ao redor se concentrou no local onde o corpo de Ränaghar começava a se materializar, formando um imenso turbilhão ardente. Dessa vez foi impossível para o elfo conter a voz e um grito de sofrimento ecoou entre as chamas do ataque.

— Que Maherlyondhür receba teu espírito no submundo, seu desgraçado! – Empunhando a espada com ambas as mãos, o rapaz incendiou a lâmina e desferiu um golpe horizontal que penetrou o turbilhão. Um último grito foi ouvido e, então, uma enorme explosão aconteceu. O Fogo se espalhou pela praça, mas foi rapidamente controlado pelo jovem a fim de que não causasse danos ao corpo de seu falecido pai. Fitando o local onde antes havia um pilar de fogo, havia apenas pequenas brasas no chão queimado. Ele caminhou até o corpo de seu pai e caiu de joelhos. — Acabou... Pai. – Lágrimas escorreram pelo seu rosto, mas evaporaram antes que caíssem ao chão. — Me perdoe... Não fui rápido o bastante. – Puxou de debaixo de sua camisa um pingente contendo uma gema azul no centro. — Você quem deveria estar usando isso. Poderia tê-lo salvado, mas eu tirei isso de você. – Seu semblante carregava a dor de saber que o que havia em seu pescoço poderia ter evitado a morte de seu pai, pois tratava-se de uma lágrima de fênix que, segundo a lenda, concedia imortalidade a seu portador. E embora não estivesse certo de que a lenda era real, não podia suportar o fato de que exigira o pingente como presente por seu nascimento no mês anterior. Culpa e pesar encheram seu coração. Enquanto as lágrimas regavam seu rosto, em seu íntimo, clamava a Auriën desejando, de alguma forma, trocar de lugar com seu pai. No entanto, era em vão.

Seu luto e sua súplica foram interrompidos por aplausos.

— Não sou nenhum herói, então não precisam... – Voltando-se para traz, o rapaz entrou em choque, porque era Ränaghar quem o aplaudia. Parte de sua armadura derreteu com o calor do ataque, parte de seu corpo estava deformado e repleto de terríveis queimaduras.

— Impressionante! – Disse sorrindo, enquanto seu corpo regenerava a as feridas e a pele queimada. — Devo admitir que o subestimei, garoto.

— Isso está errado... Como é possível que ainda esteja vivo depois de tudo isso? – Pensou enquanto agarrava o cabo da espada para uma nova investida, contudo, não conseguia levantar-se, suas pernas não respondiam os estímulos. — Você deveria estar morto... Eu o matei!

— Ora, seu tolo... Não se pode matar o que já está morto. – Ränaghar sorri encarando o pingente no pescoço do jovem. Em seguida, olhou fixamente nos olhos do rapaz. — Eu morri no dia em que Auriën abandonou a mim e meu povo para ser massacrado por vocês, humanos de merda. – Uma fumaça negra emergiu das mãos do elfo e logo as espadas de lâminas azuis se materializam. Então, ele se aproximou lentamente do jovem que ainda estava paralisado. — Louvado seja Maherlyondhür! Suas sombras cobrirão este mundo e seus ventos trarão vingança a meus... – A fala do elfo é interrompida por uma onda de choque que o jogou para longe, fazendo-o cair e desmaiar em meio aos escombros do que antes era uma floricultura.

O responsável pelo ataque apontava um cajado em direção ao local onde antes estava o elfo. Tinha o rosto coberto por um capuz branco e trajava um belo manto azul-celeste. Suas mãos delicadas e unhas grandes entregavam sua natureza feminina. Prontamente, o jovem a reconheceu por seu cajado. Ele era branco e um brilhante cristal carmesim estava cravado em sua ponta. Aquela era Gaya, a onipotente. Possuía grande renome em Azgra, pois suas habilidades faziam jus ao título que recebera, embora não fosse onipotente de fato. Outrora auxiliou o Exército Real nas expedições de Gonwë onde protegeu os soldados dos perigos do local e os trouxe de volta à casa vitoriosos e sem nenhuma baixa. O feito foi extraordinário. Jamais houve alguém que fosse a ilha de gelo e retornasse sem ferimentos graves. Ela foi a primeira e única.

— Levante-se, Farghüs! – Ordenou ao jovem enquanto realizava alguns movimentos com a mão ao redor do cajado. — Não temos tempo a perder. Prepara-se!

— Me preparar? Para quê? – Farghüs levantou-se e correu em direção a Gaya.

— Me entregue o pingente, rápido! – Disse a maga, estendendo a mão ao jovem.

— Não entendi... O que quer fazer?

— Irei arrancar a imortalidade de Ränaghar com ele. Vamos, entregue-o a mim! – Gaya reiterou o movimento pedindo o pingente a Farghüs.

— Certo. – O jovem entregou o pingente a Gaya e olhou em direção aos escombros onde o elfo caíra. — O que posso fazer para ajudar?

— Terá de me proteger enquanto realizo o ritual. Não deixe que ele pise no círculo de magia até que eu permita, entendido? – O jovem assentiu com a cabeça. — Ótimo! Quando tudo estiver pronto falarei teu nome, então saberá que terminei o ritual. Agora, afaste-se.

Farghüs se afastou e Gaya começou o ritual segurando o cajado com ambas as mãos e golpeando o chão 6 vezes com a ponta de ouro enquanto recitava algumas palavras na antiga língua dos Anciãos. Então, um círculo de luz com várias runas surgiu sob seus pés. O pingente começou a reagir ao encantamento flutuando acima da cabeça da maga. Gaya voltou a recitar palavras na língua antiga e a estrutura do pingente se desfez em poeira, restando apenas a gema azul.

Nesse momento, Ränaghar recobrou a consciência e saiu de debaixo dos escombros. Percebendo o que Gaya estava fazendo, levantou-se e correu em sua direção, mas foi interceptado por Farghüs.

— Ainda não terminamos, fada negra. – Disse apontando a lâmina de cobre para o pescoço do elfo.

— Não perderei tempo contigo, tenho outra prioridade no momento. Adeus. – Ränaghar deu um passo à frente se teletransportando em forma de névoa para perto do rapaz. Então, com um movimento rápido, perfurou o estômago de Farghüs com sua espada. — Moleque... Dê lembranças a teu pai por mim. – Farghüs segurou a mão do elfo impedindo que ele retirasse a lâmina de seu corpo e fosse em direção à Gaya. Se isso acontecesse significaria a morte para todos os habitantes de Méazös. Ränaghar precisava ser detido ali, a todo custo.

— J-já disse... A-ainda n-não terminamos. – Ofegante por causa do ferimento, Farghüs começou a queimar o braço do elfo com as mãos a fim de que ele largasse a espada, mas isso não funcionou. Ränaghar, por sua vez, cravou a outra espada em Farghüs logo abaixo da costela, no lado esquerdo, e imediatamente começou a desferir diversos socos em seu rosto até que ele desmaiasse e viesse ao chão.

— FARGHÜS, NÃO! – Ao ver que Ränaghar derrotou facilmente seu guardião, Gaya sabia que seria a próxima. Estava indefesa enquanto realizasse o ritual e interrompê-lo naquele instante seria desastroso, não só para ela como, também, para toda o reino. — O que eu faço? Não posso parar agora... – Pensava olhando para o corpo moribundo de Farghüs.

Ouvindo Gaya, Ränaghar retirou as espadas do corpo de Farghüs e caminhou em sua direção para atacá-la. Farghüs despertou com a dor da retirada das lâminas. Ao ver o ferimento mortal em seu estômago não pode conter o desespero e gritou. Sabia que cauterizá-lo não adiantaria, a hemorragia interna se encarregaria de matá-lo de qualquer forma. Mesmo sem opções, Farghüs cauterizou o ferimento da costela e parcialmente o do estômago, deixando uma pequena abertura para que o sangue escoasse. Assim, o jovem guerreiro levantou-se em meio a dor e, a passos lentos, perseguiu o elfo.

Gaya não conteve as lágrimas ao ver o esforço de Farghüs para impedir que Ränaghar a alcançasse. Ela brevemente se distrai ao lembrar dos feitos do pai do garoto e que sua coragem e determinação eram tão fortes quanto a que presenciava no filho. Lembrou do quanto o amou na juventude, mesmo não sendo correspondida. Mas o que mais encheu-lhe o coração foi a lembrança da sólida amizade que possuíam.

— Que os deuses me perdoem e me abençoem pelo que farei... Não há outro escape. – Pensou ela.

As runas mudaram, área do círculo diminuiu e Gaya, com ambas as mãos, agarrou o pingente acima de sua cabeça deixando seu cajado cair. — “Maedhür, que teu calor aqueça o coração do aflito! Wendariel, que de teu ventre nasça a esperança! Thiërallia, que tuas águas curem as feridas do tempo! Kyonmar-Rhyr, que a brisa de um novo dia restaure a coragem perdida! Auriën... que tua luz guie a as mãos que trarão a paz a este mundo!” – Suplicava na língua anciã enquanto observava o inimigo se aproximar. — “Que o sangue derramado neste dia seja restaurado e que o Sol de ontem brilhe na escuridão de hoje...” – Num piscar de olhos, suas palavras são interrompidas. Ränaghar reprimiu as preces de Gaya ao rasgar sua garganta. Ele sorriu enquanto observava o sangue escorrer pelo corpo da maga.

Tudo aconteceu em uma fração de segundos. No instante em que a maga se perdera em suas preces, o elfo criou uma ilusão com a névoa e utilizou seu teletransporte para, sorrateiramente, aproximar-se de Gaya pelas costas.

Gaya voltou seu último olhar para Farghüs que agora rastejava lentamente, já quase sem forças, tentando alcançá-la em seu auxílio.

— Não haverá amanhã, vadia! – Disse Ränaghar. E assim como fizera antes com o pai de Farghüs, decapitou Gaya. — Esta noite jamais terá fim, porque eu sou a escuridão e assolarei toda esta terra imunda. Teus deuses se curvarão a meus pés e deles serei rei e senhor! – O elfo percebendo Farghüs ao chão, ainda rastejando em sua direção, agachou-se segurando a cabeça de Gaya. — Agora terminamos...! – Fitando o jovem moribundo, Ränaghar lançou a mesma espada usada para decapitar a maga em direção à cabeça de Farghüs.

A morte de Gaya não interrompeu o encantamento, mas gerou uma instabilidade no círculo de magia que fez com que a lágrima da fênix se estilhaçasse e produzisse uma gigantesca explosão mágica que abarcou toda a cidade.

De repente, em meio a explosão, tudo ficou escuro como a noite. Já não se sentia o chão sob os pés... Ele estava caindo.  

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